Volume 1
Número 1

20 de dezembro de 2004
 
 * Edição atual    

          Em que medida a comunicação afeta a percepção da qualidade nos serviços de saúde ?

Nelson Nogueir*

          Resumo

           Este estudo terá por objetivo conhecer, dentro do fenômeno da comunicação interpessoal, as modalidades de interações sociais constituídas através dela à formação das exigências, expectativas e percepções desses atores sociais, além do entendimento de como se dá a relação entre paciente e atendente. Para isso, estudaremos os principais conceitos de serviços, qualidade e os fundamentos teóricos do modelo conceitual formulado por Parasuraman, Zeithaml & Berry — e seus posteriores refinamentos —, que resultaram na escala Servqual, cuja concepção determina que a qualidade dos serviços — de qualquer natureza — detectada por uma clientela, resulta do hiato entre as expectativas iniciais e a performance percebida do serviço.

          Palavras chave: comunicação interpessoal; qualidade, serviços, percepção

          Abstract

           This study presents, within the interpersonal communication phenomenon, social interactions modalities realized through the formation of demands, expectation and perception in the relation patient-server. For doing so, we used the theoretical foundations of the concept model formulated by Parasuraman, Zeithaml and Berry – and their posterior refinements, which resulted in the Servqual scale, whose conception determines the quality of services – of any kind detected by a clientele, results in a gap between the initial expectations and the realized performance of the service

          Palavras chave: interpersonal communication; quality; services;perception

          A Comunicação com o paciente

          Para estudar os fenômenos, relacionados à comunicação com o paciente de uma maternidade e focá-los neste trabalho, fomos buscar também suporte na literatura que aborda aspectos médico-hospitalares que tratam dos conceitos envolvendo as relações de atendimento paciente versus atendente. Neles, um dos aspectos mais importantes é o da comunicação. Muitas vezes, o profissional da saúde tem a intenção de estabelecer um bom contato, mas fatores comunicacionais tendem a afastá-lo e podem mesmo ocasionar erros profissionais.

          Atualmente, a obrigatoriedade de informar detalhadamente aos pacientes sobre o estado, tanto da parturiente, quanto ao seu filho recém-nascido, com os porquês dos tratamentos e prescrições — permitindo que as mães decidam, com mais embasamento, sobre alguns itens que desejam seguir — já é um grande avanço no âmbito comunicacional. Invariavelmente, porém, esse tipo de comunicação se faz de uma forma unidirecional, seguindo um modelo paternalista.

          O modelo bidirecional, mais eficaz no entendimento de Caprara & Franco (1999), exige mudanças de atitude do profissional, no intuito de estabelecer uma relação empática e participativa que ofereça ao paciente a possibilidade de decidir na escolha de alguns atributos presentes no atendimento.

          O primeiro contato do paciente com o profissional ocorre, na maioria dos casos, quando aquele está sob determinada tensão ou crise; é provável, por conseguinte, que suas ansiedades se intensifiquem e pareça estar mais perturbado do que em outros momentos.

          Menzies (1970) nos lembra que se o profissional atendente pode conter o excesso de ansiedade que o paciente não consegue enfrentar nesse momento, isso poderá proporcionará alívio e dará oportunidade a que surjam os aspectos mais maduros do paciente e a que este recobre a capacidade (diferente de cada indivíduo) de compreender, elaborar e finalmente integrar a situação dolorosa.

          Todas as atitudes do profissional repercutem sobre o paciente — e terão significado terapêutico ou antiterapêutico — segundo as vivências que despertarão nele e no profissional. Perestrello (1982) nos garante que a psicoterapia implícita que existe no relacionamento profissional-cliente é constituída das atitudes do profissional no seu relacionamento com o este último (o paciente), dirigidas a um fim terapêutico, qualquer que seja a natureza das medidas de ordem técnica. Este papel psicoterapêutico consiste, entre outras coisas, em evitar transmitir uma sobrecarga de ansiedade através de atitudes, gestos, expressões fisionômicas e palavras.

          Segundo Silva (1996), a comunicação é adequada quando se consegue usá-la para diminuir conflitos e desentendimentos, além de atingir objetivos definidos, a fim de solucionar problemas detectados na interação com o indivíduo. A comunicação, portanto, deve ser empregada de forma correta para que a ansiedade (expectativa moderada) presente no período da gestação seja exteriorizada de forma a não aumentar sua intensidade, o que poderá acarretar sérios problemas, tanto para o feto como para a mãe.

          Usando a comunicação adequadamente, o profissional pode estimular mudanças de atitude e comportamento no indivíduo. Isso porque o atendimento das necessidades humanas básicas desse indivíduo depende, quase sempre, do tipo de comunicação que se estabelecerá entre ele e o profissional da saúde. Outro ponto fundamental é o uso consciente que o profissional deve fazer de sua capacidade de comunicação com o indivíduo a que atende, o que facilitará, por certo, o alcance dos objetivos da assistência.

          Instrumento para coleta de dados

          Para medição das expectativas e percepções relativas aos serviços prestados pela maternidade através de seus atendentes, fui utilizado a escala Servqual originalmente pensada por Parasuraman; Zeithaml & Berry (1988) que implicaram em algumas alterações. Tais modificações foram estabelecidas tendo como matéria prima, os trabalhos realizados por URDAN (1995) e a própria voz do paciente, que utilizamos como redirecionador do instrumento original.

          Dessa forma, as cinco dimensões originais da escala Servqual (tangível, confiabilidade, prontidão, garantia e empatia) sofreram adaptações nas questões correspondentes de cada dimensão, oriundas da análise qualitativa junto aos pacientes, procurando-se adequar às especificidades da pesquisa. As alterações relacionaram-se aos pontos discutidos a seguir:

          O levantamento qualitativo realizado através das entrevistas com uma amostra de 12 pacientes utilizou questões semi-estruturadas e complementadas, formuladas com abordagens de caráter aberto, permitiram que as parturientes colocassem os atributos mais importantes de um serviço de atendimento ao parto e todos os seus periféricos. Dentre esses estão incluídos itens como refeições — alimentos e bebidas, copeiros, nutricionistas, recepção — front office, arrumação de quarto — camareiras, enfermeiras, sala de parto, médicos, funcionários administrativos. Enfim, os meios, equipamentos e recursos humanos que envolveram todas as etapas do processo de atendimento dado pelo hospital. A partir daí, utilizando-nos dos atributos valorizados pelos pacientes e com base também nos quesitos originais da escala Servqual, obtivemos 22 itens para medição da percepção do serviço hospitalar prestado. Mesmo com as alterações, procuramos manter a maior proximidade possível com a estrutura da escala Servqual original. Segue abaixo o modelo de questionário adotado:

          1. O hospital XYZ tem equipamentos de aparência moderna.

          2. As instalações físicas (quarto, recepção, berçário, sala de parto, sala de espera) são visualmente bonitas e agradáveis.

          3. A equipe (enfermeiros, médicos, camareiras, copeiros e funcionários administrativos) do hospital XYZ tem boa apresentação.

          4. As roupas de cama e banho são bonitas e limpas.

          5. A limpeza, a higiene do quarto e do banheiro são impecáveis.

          6. O hospital XYZ ofereceu refeições adequadas e servidas na temperatura certa.

          7. O quarto proporcionou tranqüilidade e silêncio.

          8. Quando o hospital XYZ prometeu fazer alguma coisa até um certo horário/data e cumpriu sem atrasos nem imprevistos.

          9. O hospital XYZ executou os serviços e procedimentos dirigidos a Sra. corretamente logo na primeira vez.

          10. O hospital XYZ se esforçou para manter todas informações sobre a Sra. sempre corretas e livres de erros.

          11. No hospital XYZ, a equipe (enfermeiros, médicos, camareiras, copeiros e funcionários administrativos) atendeu sem demora aos seus pedidos e necessidades.

          12. Quando a Sra. teve um problema e precisou auxílio, o hospital XYZ demonstrou interesse sincero em resolvê-lo.

          13. A equipe (enfermeiros, médicos, camareiras, copeiros e funcionários administrativos) do hospital XYZ esteve sempre disposta a ajudá-la.

          14. O hospital XYZ fez com honestidade o que foi melhor para a Sra.ª.

          15. A Sra. se sentiu segura quando utilizou os serviços do hospital XYZ.

          16. A equipe (enfermeiros, médicos, camareiras, copeiros e funcionários administrativos) tratou a Sra. com cortesia e simpatia.

          17. O comportamento da equipe (enfermeiro, médicos, camareiras, copeiros e funcionários administrativos) inspirou confiança para a Sra.

          18. No hospital XYZ, a equipe (enfermeiros, médicos, camareiras, copeiros e funcionários administrativos) apresentou conhecimentos e habilidades necessários para fazerem o melhor para a Sra. em cada situação.

          19. O hospital XYZ deu a Sra. atenção especial, individualizada, buscando conhecer suas necessidades específicas.

          20. O hospital XYZ tem horários cômodos e adequados (de refeições, visitas, limpeza).

          21. A equipe do hospital XYZ esclareceu previamente a Sra. quando e como os serviços e procedimentos serão realizados.

          22. É fácil estacionar no hospital XYZ.

          Para as respostas foi utilizada uma escala intervalar de cinco pontos, todos eles numerados e legendados. A numeração variava de um a cinco e as legendas são as seguintes:

          MPE - muito pior que o esperado (1) PE - pior que o esperado (2)

          DE - dentro do esperado (3) ME - melhor que o esperado (4)

          MME - muito melhor que o esperado (5)

          Pesquisa junto às mães

          A amostra deste estudo constituiu-se de 127 casos, aplicados em uma organização participante. Quanto à escolaridade dos seus integrantes 46,5% possuem ensino médio completo; 49,6% estão na faixa etária de 20 a 29; 55,9% das mães estavam ganhando o segundo filho; e 42% vieram à maternidade XYZ por influência do próprio médico que acompanhou o pré-natal.

          Tivemos 13% das futuras mães visitaram a maternidade, conversaram com os funcionários e decidiram em escolher o hospital. Uma outra variável importante que aparece neste item é que 55,9% das pacientes já tiveram a experiência dos serviços de maternidade no seu primeiro filho, a maioria em outro local. As parturientes informaram ainda ter identificado na maternidade XYZ um modelo de excelência e que teriam outros filhos no mesmo local. Uma melhor caracterização da amostra pode ser visualizada na tabela abaixo.

          Caracterização da amostra

Escolaridade Frequência Porcentagem
Ensino  fundamental 02 1,6
Ensino médio incompleto 10 7,9
Ensino médio completo 59 46,5
Ensino superior incompleto 05 3,9
Ensino superior completo 51 40,2

           

Faixa Etária Frequência Porcentagem
Menos que 20 anos 01 0,8
20 a 29 anos 63 49,6
30 a 39 anos 60 47,2
40 a 49 anos 03 2,4

           

Número de filhos Frequência Porcentagem
Primeiro filho 25 19,7
Segundo filho 71 55,9
Terceiro filho 28 22,0
Quarto filho 03 2,4

           

Indicação para esta maternidade Frequência Porcentagem
Médico 54 42,5
Família 29 22,8
Amigos 30 23,6
Visita no local 13 10,2
Propaganda 01 0,8

          Análise e conclusões

           A realizar cruzamentos estatísticos da amostra, utilizando o software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) e analisando os resultados apresentados, encontramos algumas dimensões melhor avaliadas, ocasionadas por um mesmo grupo de mães.

          Vejamos primeiro os aspectos tangíveis que obtiveram a média geral avaliada de (4,18). Esses se referem às instalações, privacidade do local, aparência das pessoas, materiais utilizados, entre outros. As mães com a maior idade da amostra, maior número de filhos e maior escolaridade, indicadas para a maternidade por amigos, médicos e família, apresentaram as menores médias na pesquisa, mesmo porque já possuíam antes experiência com outras maternidades, trazendo nesta bagagem um nível melhor de percepção de detalhes do ambiente em que se encontram.

          Os aspectos tangíveis se configuram como um pano de fundo, atraindo a clientela apenas de forma marginal; apresentam grande influência quando não se tem conhecimento do serviço ou indícios de informação de um serviço puro como o estudado nesta tese. Os clientes ou futuros pacientes confiam muito nos indícios visíveis, principalmente quando definem a empresa através de visitas ao local, como aconteceu por uma parte das parturientes. Foi uma forma de prever como seria o atendimento e isso implica na elevação das expectativas dessas pacientes em relação aos serviços a serem prestados no futuro, quando da internação.

          Já no aspecto oposto, as mães que ganhavam seu primeiro filho apresentaram as maiores médias nos resultados. A maioria possuía escolaridade superior e idades variadas, dentro da amostra. As indicadas para a maternidade estudada por amigos e membros da família elas apresentaram as maiores médias nessa dimensão. Essa dimensão apresenta também flutuação durante os serviços quando ocorrem fatos ausentes e desagradáveis, como por exemplo, aqueles citados nos comentários gerais (limpeza inadequada do quarto, utilização de lençóis velhos, aparelho ruim, falta de material, roupas de cama ruins, refeição com aspecto ruim e frio).

          Todas essas percepções provocaram um comportamento de descontentamento, embora fatores visuais das instalações prediais tenham impactado de forma positiva num primeiro momento da escolha, como instalação, arquitetura, decoração, conforto e atendentes bem apresentados. Tais elementos deram um ar adequado a tudo isso, mas não compensaram os resultados negativos obtidos.

          Segundo Berry (1991) quanto mais instruído o cliente, menos sensível é para com as dimensões tangíveis. A dimensão tangível não convence sobre o serviço de uma forma geral, diz o pesquisador, e confirmados nesta tese, são fatores higiênicos que, presentes e adequados, auxiliam na decisão de escolha ou compra, mas passam despercebidos ao longo da interação cliente–fornecedor e dos processos comunicacionais.

          Mas quando algo errado ocorre, aí sim, tal fator entra em ação. Nessa dimensão a comunicação interpessoal, mesmo apresentando interesse no comunicado, levará o receptor a tentar compreender a mensagem a todo custo, mas as expectativas não poderão ser atendidas e reguladas, pois passam a ser exigida mudanças de produtos, materiais e às vezes até na estrutura dos padrões da empresa, incluindo à limpeza, leiaute, uniformes, aparências dos funcionários, cores; o papel da comunicação interpessoal é apenas entender a paciente e amenizar o fato apresentado como não conforme— mas ele já ocorreu.e dificilmente a opinião será mudada.

          Vejamos os aspectos de confiabilidade que obtiveram a média geral avaliada de (4,21). A dimensão da qualidade a confiabilidade , ou seja, prestar o serviço prometido de modo confiável e com precisão, é a dimensão mais importante num processo de serviço. Percebemos durante a pesquisa de campo que o serviço médico, mesmo satisfazendo os critérios técnicos, apresenta fortes características de subjetividade na avaliação que o paciente faz dele. Vejamos, por exemplo, o comentário de uma paciente: "percebo a qualidade do médico ou atendente, pelo tempo que ele leva para me examinar".

          As expectativas e exigências dos clientes formam, desse modo, os verdadeiros padrões de confiabilidade quando, o que está sendo avaliado, é essencialmente um desempenho, em vez de um objeto. Esses padrões devem ser identificados para serem revertidos em favor dos próprios funcionários. Tal identificação necessita produzir comunicação já que, segundo a teoria dos sistemas, só comunicação produz comunicação. Assim, é necessário um auto-ajuste entre as necessidades comunicadas pelas pacientes enquanto emissoras de um conteúdo, tendo uma recepção do outro lado a receber essas necessidades. Mas ocorre também o inverso: nesse caso o receptor faz o papel de emissor nas promessas de serviços e o receptor entende e gera expectativas internas. Essa relação é um continuum nas conversas entre pacientes atendentes e sua regulagem é dinâmica e pode variar de momento a momento.

          Tal prática comunicativa precisa, portanto, ser uma rotina desejada e praticada pelos próprios empregados da unidade hospitalar. Por isso, a supervisão deve encorajar tais características nos seus subordinados e enfatizar sempre a importância da confiabilidade nas comunicações da empresa, inclusive em relatórios e memorandos. Na nossa pesquisa a melhor média ao item confiabilidade foi atribuída pelas mães com ensino médio completo, a maioria tendo seu segundo filho, idade dividida entre 20 e 39 anos e com indicação a maternidade feita pelo médico.

          Entre as menores médias estão as mães com ensino médio incompleto, a maioria tendo seu segundo filho, idade entre 20 e 29 anos, mais jovens que as anteriores e com indicação à maternidade feita pelo médico. Essa dimensão está relacionada ao grau de exigência e solicitações de "coisas" para o atendimento de necessidades, normalmente relacionadas à informações e explicações de procedimentos ligados aos trabalhos de rotina realizados. Lembremo-nos a afirmação de várias mães durante as pesquisas como: a pior coisa é ficar aqui e não saber o que está acontecendo, as pessoas não informam; ficamos imaginando algo ruim que está acontecendo. Essa dimensão possui como pano de fundo a comunicação interpessoal como regulador das promessas e limites do que temos ou não temos, do que pode ou não pode nos serviços oferecidos pela maternidade, conseqüentemente a percepção sobre os serviços irá ser afetada, esta dimensão que é o resultado de todo o serviço cumprido adequadamente em todas as etapas do processo possui uma interferência muito grande da comunicação interpessoal formando um emaranhado de promessas muitas cumpridas e outras não, regulando a percepção sobre a qualidade dos serviços. Nesta dimensão a prática comunicativa é colocada em primeiro plano para levar de forma positiva todos os benefício e recursos disponíveis na maternidade para os pacientes.

          As outras dimensões da qualidade — presteza (4,35), garantia (4,30) e empatia (4,41), que obtiveram as melhores médias gerais — abrangem, respectivamente, a boa vontade de servir, disposição, sinceridade. A confiança gerada pelo conhecimento do atendente, a cortesia e explicações adequadas, consideração, atenção e conhecer as necessidades, apresentaram as maiores médias na totalidade da amostra obtidas pelas parturientes que ganhavam seu primeiro filho. Essas possuíam ensino médio completo e situavam-se nas faixas de 20 a 39 anos e indicadas pela família ou amigos para a maternidade. Já as menores médias foram obtidas pelas mães com ensino médio incompleto e ensino superior completo, a maioria tendo seu segundo filho, idade entre 20 e 29 anos e indicadas pelo médico para a maternidade. Aí as dimensões da qualidade estão diretamente relacionadas com o saber ser, formação escolar e humana, experiência profissional das atendentes, vontade de servir e entender o próximo.

          Na análise dessas dimensões, como foi dito ao longo deste artigo — se observarmos atentamente os atores do processo pesquisado, ou seja, paciente (parturiente) e atendente — veremos que ambos partilham expectativas comuns quanto ao desempenho de seus respectivos papéis. Tais expectativas estão integradas a um sistema de valores mais vasto, também compartilhado, e por isso, ocorre uma evidente introjeção, quer com relação às expectativas, quer com relação aos valores em si.

          Nesse contexto, os agentes tenderão a cooperar entre si num padrão coordenado de atividades por três razões básicas: encontram-se comprometidos com o curso de ação esperado ou prescrito, porque cada um de per si o interiorizou como mais adequado ou apropriado; introjetam outros valores relacionados, que podem ser ameaçados caso exista uma falha em levar adiante as exigências que a situação represente; e/ou têm receio de serem punidos por não agirem adequadamente, frustrando expectativas ou perdendo estima, amor e aprovação.

          Assim, o receptor deve estar interessado no comunicado e tentará compreender a mensagem a todo custo. Os participantes do ato comunicacional formam expectativas baseadas na sua experiência pessoal e orientam-se por elas, além do fato de que emissores escolhem suas informações dependendo das reações que esperam do receptor. Por este raciocínio devemos levar em conta a qualidade do canal e da mensagem que nele trafega, avaliando o ambiente em que ocorre o evento.

          Dessa forma, mesmo o hospital não possuindo padrões de atendimento, postula-se um teorema da ação institucionalizada, em obediência ao qual qualquer padrão de atividade tenderá a cristalizar-se ao longo do tempo. E ocorrerá porque qualquer tentativa de desvio em relação às expectativas esperadas originará conseqüências desvantajosas para todos.

          É pois, através da introjeção de valores comuns, que um sistema de interações sociais pode ser estabilizado. Uma das faces mais visíveis desse ponto de vista tende a enfatizar o consenso, favorecendo a estabilidade e a durabilidade das estruturas sociais.

          É somente a partir do processo de intersubjetividade construído e conseqüentemente vivenciado no âmbito de uma mesma pauta cultural, que a plena realização do nós, pode, portanto, ter lugar. A paciente não pode ter acesso a esse sistema de significação, da mesma forma que não podem os membros do grupo profissional dentro do qual ela se inseriu por alguns dias apenas. A parturiente não compartilha de um passado comum com o grupo. As possibilidades abertas para tal caminho direcionam-se para a efetivação do nós, mas não sem riscos na comunicação e atendimento. Seus constantes experimentos em cada contacto com os atendentes — ou atores do processo — manifestam-se em novas situações de tensões.

          A comunicação, por si só — ou seja, enquanto recurso de linguagem convencional —, não é uma garantia segura do normal desempenho do sistema, conforme o entendemos neste estudo. A formação dos média do sistema simbolicamente generalizados, além do dinheiro, poder e da influência dos pacientes se dá por termos presentes o amor e a verdade, já que nesse sistema de valores deve ser incluída a presença de um novo ser que chega ao mundo.

          Tais simbolismos operam como uma espécie de substitutos da linguagem, em perfeita solidariedade com o funcionamento dos sistemas, de forma a garantir a sua operatividade e, ao mesmo tempo, definir novos padrões do entendimento das expectativas e necessidades humanas. E falar de expectativas, significa, desde logo, admitir o caráter contingente do sucesso. Pode ser traduzido, em última análise, como permanecer sempre em aberto, tanto à possibilidade de aceitação, como à de recusa das mensagens, já que o processo de comunicação preserva, até o limite, um indispensável grau de abertura, que é simultaneamente condição do seu sucesso, mas também a eventualidade do seu fracasso. Nestas dimensões apresentadas o principal constructo é a função comunicativa que constrói as relações paciente-atendente e é fortalecida pelo conhecimento técnico que encorpa a dimensão garantia.

          Em nosso estudo, essa admissão da contingência — e o grau de abertura e tolerância encontradas nas pacientes — propiciaram resultados até que satisfatórios de percepção dos serviços prestados e grande parte das questões foram avaliadas como dentro do esperado, isto é, as expectativas eram as mesmas percebidas a respeito dos serviços prestados pelo Hospital XYZ, através de seus atendentes.

          Outros pesquisadores poderão, acreditamos, dar seqüência a este trabalho, ampliando a pesquisa para os demais hospitais e maternidades da região. Com isto, o entendimento dos fenômenos comunicacionais poderá proporcionar a criação de atendimentos cada vez mais integrados às expectativas dos pacientes, trazendo benefícios de imagem e aceitação. Assim, mais usuários procurarão esse tipo de organização, já que, como vimos, a comunicação boca a boca para este segmento é a principal alavanca na conquista de novos clientes que um dia se tornarão pacientes.

          Acreditamos também estar prestando uma grande contribuição à saúde da população e aos profissionais da saúde cujo desafio é cada vez maior, pois não é apenas a competência técnica o indicador de sucesso profissional e sim o saber entender e cuidar dos pacientes.

          Referências bibliográficas

BERRY, Leonard L. Serviços de Marketing, competindo através da qualidade. São Paulo: Maltese, 1991.

CAPRARA, A; FRANCO, AL.S. A Relação Paciente Médico: para uma humanização da prática médica. Cadernos de Saúde Pública, SãoPaulo 15(3): p. 647-654, 1999.

MENZIES, I. The functioning of organizations as social systems of defense against anxieties. London (UK): Tavistock Institute of Human Relations, 1970. Trad. e adaptação de Aracy Martins Rodrigues para a fundação Getúlio Vargas, 1970.

PARASURAMAN, A.; ZEITHAML, Valarie A.& BERRY, Leonard L. Servqual: a multiple-item scale for measuring consumer perceptions of service quality. Journal of Retailing, New York (EUA), 64(1), p. 12-40, spring. 1988.PERESTRELLO, D. A Medicina da Pessoa. Rio de janeiro: Atheneu, 1982.

SILVA, M.J.P. Comunicação Tem Remédio: A comunicação nas relações interpessoais em saúde. São Paulo: Gente, 1996.

URDAN, André T. Qualidade de Serviço: proposição de um modelo integrativo. 1993. 355f. Tese de Doutorado em Ciências Admnistrativas da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1993.

 

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Nelson Nogueir
Doutor em Comunicação social pela UMESP.

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